Do Senso Comum à Consciência Crítica
A palavra "Filosofia" tem origem nos substantivos gregos "phylo" (amor, amizade, respeito) e "sophia" (sabedoria, conhecimento). Filósofo, portanto, é o amigo da sabedoria, amante e entusiasta do conhecimento. Não aquele que sabe de tudo, que já alcançou o conhecimento ou tem resposta para tudo, e sim aquele que busca o conhecimento pelo próprio prazer de conhecer. Para o filósofo, conhecer é um privilégio sem medida.
Conhecer é tomar consciência da realidade, tornar-se consciente do mundo e dos acontecimentos a nossa volta. Conhecer e saber não são sinônimos, e, embora esses dois verbos sejam parceiros inseparáveis, nem sempre os sentidos atribuídos a cada uma destas ações são próximos e parecidos. Afinal, nem todos que "sabem" as respostas das perguntas apresentadas "conhecem" de fato o sentido de cada uma delas. O saber pode ser fruto apenas de memorizações intensas, resultantes de repetições exaustivas, enquanto o conhecer provém da reflexão, do confronto, da tomada de consciência.
Essa diferença entre saber e conhecer estão presentes também na comparação entre "senso comum" e "consciência crítica", também conhecida por "bom senso". O primeiro (senso comum) pode ser compreendido como uma sabedoria de vida, resultante de longas e repetitivas experiências vividas ao longo de uma existência, enquanto o segundo (senso crítico) tende a ser visto como um conhecimento melhor elaborado. Para melhor compreender cada um deles, faremos agora uma breve descrição:
- Senso Comum é a primeira forma de conhecimento que temos do mundo. Conhecimento prático, adquirido no cotidiano, acumulado ao longo de toda a vida, visto facilmente como "sabedoria de vida", ou apenas "experiência de vida". Um detalhe importante para compreender o senso comum é que ele é essencialmente prático, dispensa a reflexão teórica, e se faz por meio de indução. É a porta de entrada que todos nós trilhamos rumo ao conhecimento. Uma pessoa que nunca frequentou a escola, por exemplo, pode não ter sido alfabetizada, mas isso não faz dela uma pessoa "burra" ou "ignorante". Pelo contrário, mesmo não alfabetizada, pode ter uma experiência de vida excepcional.
- Senso Crítico é um conhecimento melhor elaborado e profundo quando comparado ao senso comum. Tem origem no confronto entre teoria (reflexão teórica, crítica) e prática (experiência vivida). Enquanto o senso comum tende a valorizar apenas a prática e desconsiderar a teoria, o senso crítico procura dar a teoria e prática a mesma importância. Tende a ser, portanto, um conhecimento mais profundo.
Nas definições acima apresentadas, algumas informações relevantes merecem ser destacadas. Veja:
- Apesar de prático e cotidiano, o senso comum é um conhecimento sem método. É facilmente convencido por aquilo que vê e ouve, e tem grande dificuldade para lidar com a dúvida e a insegurança. Busca sempre a segurança da certeza, a fim de garantir a sensação de estabilidade e proteção. Superstições e crenças, por exemplo, são próprios do senso comum.
- O senso comum não é um conhecimento errado. Ele é, de todos, o que está mais sujeito e passível de erro. Em todas as descobertas do senso comum, o risco de erro é grande, e a chance de cometer graves equívocos é real. A maior causa disso está na desvalorização da reflexão teórica.
- Apesar de estar sujeito ao erro, o senso comum não é um conhecimento inútil. Prova disso é que a consciência crítica é assim chamada por ser crítica de si mesma. Ela não ignora e nem discrimina o senso comum; pelo contrário, dá a ele grande importância. Por ser prático, desde que usado com moderação e juízo, os conhecimentos que são próprios do senso comum podem ser totalmente úteis.
Conforme dito acima, o senso crítico é crítico de si mesmo. É característica constante do senso crítica o confronto entre ideal e real, teoria e prática, sonho e realidade. Vejamos um exemplo: a impressão de que o sol nasce e se põem todos os dias é uma impressão que tem origem nos sentidos (visão), pois vemos (visual) o sol nascendo de um lado e se pondo de outro lado da terra todos os dias.
Pelo sentido da visão, temos a nítida sensação de que o sol gira ao redor da terra, e ninguém precisa frequentar a escola para saber disso. Contudo, essa é só uma impressão, logo desmascarada por um conhecimento mais apurado e científico. Sabemos hoje que não é o sol que gira em torno da terra, mas a terra que gira ao redor do sol. A sensação visual de ver o sol nascer e se por todos os dias é, na verdade, uma sensação equivocada e enganosa, mas facilmente adquirida no dia a dia. A isso chamamos de "Senso Comum".
O engenheiro civil é um profissional qualificado para construir prédios diversos (casas, comércio, etc). Graças a intensa qualificação profissional recebida no ensino superior, o engenheiro civil já não pertence mais ao senso comum e está hoje em um conhecimento melhor elaborado. Ninguém melhor que ele sabe que o sol não nasce e nem se põem diariamente, e que é a terra que está girando ao redor do sol. Mas, se ele não souber de que lado o sol "nasce" e "se põem" todos os dias, não saberá como posicionar de forma adequada a sua construção para melhor aproveitar a iluminação natural e assim economizar energia.
A grandiosidade do engenheiro não está em saber que o sol está parado e nós girando, e sim na capacidade de relativizar e avaliar em que condições os conhecimento que é próprio do senso comum é necessário, e quando é necessário recorrer ao conhecimento teórico e dedutível. Em momento algum poderá ele desfazer-se do senso comum por considerá-lo ignorante e ultrapassado; ele só será um bom engenheiro se possuir juízo o bastante para avaliar com sensatez e equilíbrio qual a melhor escolha a fazer.
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